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Por trás do 15 de outubro

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Por Flavia Alli*
 
O 15 de outubro, acampamento mundial dos “indignados” pela fome, miséria, o capital e as opressões sociais, teve seu maior ato do Brasil na cidade de Porto Alegre. Reunindo cerca de 500 pessoas na Praça Matriz , após marcha de aproximadamente mil, em frente ao Palácio do Piratini, o evento discutiu a crise econômica, as revoluções e manifestações na Europa, Chile e norte da África, sob a reivindicação da Democracia Real Já. Mesas redondas à parte, o 15 de outubro foi de longe um ato de esquerda. Ao cair da noite, o que era para virar um grito simbólico contra o sistema capitalista virou uma grande festa de DCE. Ser “socialista”, hoje, inclui uma gama de pensamentos que já se comprovaram historicamente não superar o modelo de sociedade que vivemos. A julgar pela formação militante e a fragmentação da esquerda, caso estourasse a revolução amanhã, estaríamos fadados à derrota da classe. O Pós-modernismo tomou conta das academias, de modo que se segue o pensamento da lógica formal, caindo em análises lineares em formulações políticas e sociais, sem enxergar a totalidade da sociedade. O pragmatismo, no sentido partidário, se alastrou na esquerda, em que se utilizam de espaços estudantis para a autoconstrução, taticamente, com vistas às eleições. E, o pouco que resta de socialismo em algumas correntes ou seitas briga entre si na disputa da direção da vanguarda. Os programas de socialismo andam rebaixados, em sua maioria pautando conciliação de classes, pelas vias burocráticas do estado, em que um cargo na superestrutura  burguesa equivale mais do que a consciência de classe. Os poucos espaços que exploravam a contradição capital x trabalho foram esquecidos depois de muita festa na virada. Ser socialista hoje não é sinônimo de nada. Parece que mais vale quem assume posto de crítico, em uma diletância sem fim, do que de fato estudar a sociedade e apresentar propostas com método adequado para isso. Nesse sentido, mostra-se a consciência de suas juventudes, em que a maioria é carregada de ideologia em seus superegos – por exemplo, no que diz respeito ao feminismo, em que mulheres reprimem outras esquecendo que por trás deve haver debate político, e acabam se perdendo em disputas morais – considerando que isso é reflexo da opressão histórica machista. A própria luta das mulheres no movimento feminista não dá conta de casar a pauta feminista com o recorte de classe, e apontar perspectivas para trabalhar esse eixo no seio do movimento.
 
Pautar, por exemplo, “Democracia Real Já” dentro de um programa que se diz socialista é desconhecer a história da burguesia e da filosofia. Em que a própria palavra diz respeito às regras do burguês, uma plataforma programática da burguesia – hoje incompatível, é verdade, com o próprio modelo econômico proposto pela mesma. Com o intuito de promover no imaginário das pessoas que enquanto esforço individual poderá chegar a um patamar de vida burguesa, vendem-se e perdem-se “sonhos” da pequena-burguesia que acaba por prejudicar os trabalhadores na luta de classes, uma vez que em uma conjuntura de ascenso é esse setor o fiel da balança para a vitória .
 
É preciso  distinguirmos a necessidade de democracia enquanto projeto societário e enquanto uma demanda específica da realidade concreta de uma determinada particularidade. Pedir democracia na PUCRS, por exemplo, pode ser útil e necessário – em especial porque se for uma necessidade, pode aglutinar estudantes e, assim, procurar avançar nas demandas imediatas existentes até as mais globais, as quais envolvem projeto societário. No entanto, o brado por democracia em um movimento de massas pautado por uma dita vanguarda de esquerda, como  ‘’Democracia Real Já’’ ou então um ‘’Chega de Corrupção’’, fosse a saída para os problemas sociais de uma sociedade capitalista é retroceder a luta de classes, uma vez que significa apenas a tentativa de melhoramento do sistema econômico – em que sabemos que não existe tal possibilidade nos marcos do próprio capital, o qual reinventa suas formas de opressões a cada momento. Além disso, a bandeira da democracia é uma plataforma política capitalista, utilizada como ideologia para manter uma minoria no poder. Colocá-la como estratégia de um movimento de massas para a sociedade acaba por entrar em contradição com a própria história da luta de classes e das bandeiras do proletariado e oprimidos.
 
 Tão defendida pela pequena-burguesia, a democracia somente deixará de existir no comunismo, pois todos teremos equidade. Nesse sentido, a vanguarda tem deixado de pensar mais à frente, numa perspectiva de ruptura, e de olhar para trás também – pois, parece que esquece. E esquecendo, deixa de pautar à juventude políticas que respondam às necessidades reais da sociedade. A conjuntura é difícil à consciência de classe? É. E se os coletivos de juventude que constroem o movimento estudantil, hoje, não se proporem à disputa da consciência, amanhã seremos uma “esquerda” mais frágil e fragmentada, que será passada por cima numa conjuntura de ascenso, levando a lugar algum, com grande probabilidade de facilitar a vitória da burguesia sobre os trabalhadores.
 
 O 15 de outubro foi, de fato, um ato dos indignados, daqueles que estão, como diria Mauro Iasi, em “estágio de revolta” – em demandas concretas da realidade daqueles que saíram às ruas, por mais superficial que seja.  Mas, se voltarem para casa sem pensar e refletir sobre os poucos espaços politizados que lá tiveram, serão rebeldes, ativistas (de Twitter), críticos, e até revolucionários (no sentido naturalizado que o capitalismo agregou). Jamais serão agentes de uma transformação societária radical, e por isso socialismo – não capitalismo, o qual não à toa se determina conforme o capital. O que se encontra em termos de qualidade de debate dentro do movimento estudantil, hoje, está em poucas executivas de cursos, tocadas por coletivos que sobrevivem numa vanguarda de resistência da própria vanguarda. Não, por acaso, alguns coletivos mais pragmáticos do movimento estudantil e o PT estão voltando a disputar esses espaços. Os primeiros para o aparelho na auto-proclamação; o segundo, para cooptar os poucos setores ainda combativos do movimento estudantil. O 15 de outubro, pautado por uma política anticapitalista internacional, deixa aos socialistas o dever de se unificar na disputa de consciência para a luta de classes, apontando para o socialismo, por uma transformação radical da sociedade por aqueles que são protagonistas de sua própria história. E não um ato que acaba em si próprio, ciclicamente, onde forças políticas mais se preocupam com a auto-construção do que a unidade em defesa da classe trabalhadora. Queremos e temos de lutar por nossas próprias bandeiras de luta enquanto classe trabalhadora. Não queremos o que a burguesia diz que devemos ter ou fazer, e que parte da  pequena-burguesia defende. Queremos a negação, e a negação do capitalismo passa, necessariamente, pela revolução socialista.
 
(Esta visão teve base no movimento no Brasil, a partir da realidade vivida em Porto Alegre, RS.)
 
* Flávia é militante do Coletivo Barricadas Abrem Caminhos de Porto Alegre
 

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